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A Céu Aberto

por arcadajade, em 30.05.05

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Vi esta tarde no mercado de Trajano
gatos enroscados às esculturas
de Richard Serra
pareciam despojos encontrados
no mesmo mar escuro
alheios à perda do mundo
e também, também isso


Não contam uma história
diria que ninguém os chamou
sinais uns dos outros - esculturas e gatos -
um conhecimento descobrem
de quanto vemos apenas

José Tolentino de Mendonça, De Igual Para Igual, Assírio & Alvim, Lisboa, 2001

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10:16

Morada

por arcadajade, em 18.05.05

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Os gatos tomam lugar na sua própria sombra de portas arrombadas. Descem dos telhados da suposição e trazem testemunhas arranhadas. Não se servem de mistérios, apenas são silenciosos.

As suas feridas ardem de tão sinceras, geradas numa velocidade incompreensível, irredutível.

Os gatos encontram-se com os olhos cheios de luz. Vivem como lanternas neste monumento inóspito, mausoléu de dias vagamente terrestres. Os gatos circulam como corpos transbordantes, porém guardam-se de dádivas fúteis em salas de espera.

A sedução de um gato é aceitar o papel de igual. Não admite truques.

Quando as casas propõem o seu espaço, os gatos acolhem-nas e são interiores a elas. Casa e gato precipitam-se para uma linguagem de movimentos bruscos e longos sonos de parede. Os gatos constroem-se à volta de um pequeno demónio, a única coisa que o céu tem para lhes dar é pássaros. A sua religião é despida de argumentos, conclui-se numa breve teoria do fascínio.

Os dias são gatos planetários para a nossa constituição. Somos felinos quando usamos concretamente a boca sobre uma matéria de desejo. Como o vento verga os cereais arrebatados, como a água se faz cair sobre a água, como a electricidade estoura uma lâmpada, como um automóvel atropela o outono, como homem e mulher se cruzam num terraço de cristais, como o fogo reclama a aparição de susto do espírito.

Não se pode conter uma fúria, virá um gato para a puxar fio a fio. Não se pode arredar um grito, virá um gato para o trepar até ao eco. Não se pode camuflar uma sirene, virá um gato para lançar sobre os telhados o alarme ensurdecedor da nossa arrepiada biologia.

E antes que o tempo felino nos cace entre os caixotes de cartão que deixamos a apodrecer no sótão da nossa natureza. E antes que o rato vil da prudência se sente a rir sobre o nosso cadáver perfumado.

Por Canto de Ossanha que morava aqui: http://www.cantodeossanha.blogspot.com/

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08:05

André Derain

por arcadajade, em 13.05.05

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09:30