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Balthus
Quando em 1967, a Tate Gallery organizou uma exposição Balthus, pediram ao pintor elementos para uma biografia destinada ao catálogo. A resposta chegou lacónica: «Balthus é um pintor de quem nada se sabe. E agora vamos ver os quadros.» Poderia ter acrescentado: comecem pelo meu quadro intitulado O Rei dos Gatos e releiam o prefácio que Rainer Maria Rilke, amigo da minha mãe e meu na minha juventude, escreveu a propósito dos meus primeiros desenhos publicados, quarenta imagens em memória do meu gato desaparecido, o Mitsou. [...] Balthus poderia também ter sugerido à Tate Gallery que citasse uns versos de Baudelaire, mais evocativos do que uma banal biografia:
No meu cérebro passeia-se
Como se estivesse em casa
Um belo gato, forte, doce, encantador.
Quando mia, mal se ouve,
É o espírito familiar do lugar;
Ele julga, preside, inspira
Todas as coisas no seu império;
Será uma fada, será um deus?
E quando olhamos para os quadros, como sugeria Balthus, apercebemo-nos de que, de Mitsou, ao auto-retrato em o Rei dos Gatos e ao letreiro do Gato do Mediterrâneo, Balthus mostra bem que pertence à família dos gatos. Ele vangloria-se disso e diz que foi gato desde a infância.
Giles Néret, Balthus, Taschen, 2004
É difícil apanhar um gato negro num compartimento escuro,
sobretudo quando ele não está lá.
(provérbio chinês)
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Quando já comeu o toucinho,
de pouco serve à gata caçar.
(provérbio alemão)
anónimo, séc. XIX
Gato com luvas não caça ratos.
(provérbio espanhol)
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Que culpa tem a gata se a camponesa está louca?
(provérbio italiano)
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A toda a gata o seu janeiro.
(provérbio italiano)
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Gato velho nunca se queima.
(provérbio gaélico)
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Gato velho não brinca com a presa.
(provérbio inglês)
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«Hoje é jejum», diz o gato
ao ver que não alcança o toucinho.
(provérbio turco)
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Quem aos gatos ama, mulher bela terá.
(provérbio medieval)
anónimo, séc. XIX
Quando o gato come neve, boa razão há-de ter.
(provérbio russo)
em Para os Amantes de Gatos, Editorial Inquérito, 1995
Louvado seja Deus na natureza,
Mãe gloriosa e bela da Beleza,
E com todas as suas criaturas
Francisco de Assis, Cântico das Criaturas, excerto
O quarto, que em Tebas, a santa, construiu um templo ao gato.
Não era um templo a um deus-gato: antropomórfico, bronco, com uma máscara felina, substituindo a de um rafeiro.
Era um templo ao gato - escorreito, vadio, egípcio. O mesmo que em Roma dorme, imperial, nas ruínas.
Em ruínas, também, o templo levantado por Amenófis, em Tebas. Ruínas que se perderam, como se perdeu o desenho, o plano, a sabedoria que o ergueu das margens do Nilo.
Os gatos continuam por toda a parte. Se se procuram, não se encontram. Quando um homem, distraído, avalia a própria inocência e se julga capaz de prová-la, aí está um, de súbito, de garra pronta e olhos fugitivos.
Se soubéssemos o que os gatos sonham, como seria diferente o mundo. Nada de bom, por certo, e ainda bem.
José Alberto de Oliveira (1952) Bestiário