Saltar para: Posts [1], Pesquisa e Arquivos [2]



Restituiu-lhe a noite

por arcadajade, em 28.03.04

O odor a gerânios depois da rega fez parar Alain com a garganta contraída de emoção. Inclinou-se, abriu, às apalpadelas, o cesto, e devolveu a gata à liberdade. - Saha, eis o nosso jardim... Sentiu-a deslizar para fora do cesto e, em nome da imensa ternura que tinha por ela, deixou-a ir, apenas entregue a si própria. Restituiu-lhe, dedicou-lhe a noite, a liberdade, a terra permeável e doce, os insectos que velavam, e os pássaros que continuavam a dormir.


 


 


Colette, Saha, a Gata, Livro-Carta, Colares Editora

Autoria e outros dados (tags, etc)

02:00

Gato com girassóis

por arcadajade, em 27.03.04



Image hosted by Photobucket.com

Autoria e outros dados (tags, etc)

02:02

O gato e a princesa

por arcadajade, em 22.03.04

Image hosted by Photobucket.com 


 


O gato de rilke saltava-lhe para o colo nas tardes

de inverno, em duíno, enquanto ele escrevia

as elegias. Miava, como um anjo, e rilke traduzia

essa música em estrofes que, depois, recitava,

de janela aberta para o mar. A princesa de thurn e taxis,

então, chamava o gato; mas ele não ligava à dona,

e preferia saltar para o armário, onde ninguém

o ia apanhar. Rilke constipava-se; mas as elegias nada

contam do que se passava nessas tardes de duíno,

nem os incidentes domésticos, nem os problemas de

saúde. Têm, apenas, uma influência do gato: o seu

dorso negro, e os miados que dava, enquanto rilke

escrevia. Um gato pode, com efeito, inspirar poemas

de fôlego, como esses de duíno. É verdade que o

castelo já não existe; e que o vento já não entra

pela janela em que rilke se constipou. De resto, não

sei se é possível, ainda, alguém recitar poemas por

uma janela aberta, para cima do mar que tem a cor

da tempestade. Os deuses não moram, hoje, em nenhum

céu; nem os anjos gritam por intermédio de um gato A

razão, a lógica, o interesse, eis os motores do

quotidiano; e a única coisa que um gato pode fazer,

então, é passear no meio deles, de cauda encolhida,

sem nenhuma princesa de thurn e taxis a enxotá-lo,

de cima do armário, para não distrair o poeta.


 


 


Nuno Júdice, Cartografia de Emoções, Publicações Dom Quixote, Lisboa, 2001


 

Autoria e outros dados (tags, etc)

14:12

Teoria da Composição: a pequena gata (3)

por arcadajade, em 14.03.04

051502kats.jpg 



Olhos atentos tentando entender,

absolutamente parada, a cabeça tensa,

as orelhas espetadas como se pudesse ouvir

as palavras que eu ia escrevendo,

a pequena gata seguia cada um dos meus gestos

como se fossem incertos insectos

correndo inquietos sobre o papel.

Os gatos velhos e os homens jovens

não se interessam por coisas fúteis como

palavras escrevendo e gatos atentos,

têm pouco tempo, sobretudo por dentro.


 


Manuel António Pina, Os Livros,Assírio & Alvim, Lisboa, 2003

Autoria e outros dados (tags, etc)

02:12

Porque pintam os gatos? II

por arcadajade, em 03.03.04

Carta de jogar alemã, c. 1430 d.C.

Image hosted by Photobucket.com

Katzen-Kunst-Museum, Estugarda




O Gato Mau imprime a marca da sua pata no manto da Rainha Branca, usando o rouge dela.


 


 

Autoria e outros dados (tags, etc)

21:00

Oh pequeño emperador

por arcadajade, em 01.03.04

majestade.jpg

 


 


 


 


 


 



 


 


Los animales fueron

imperfectos,

largos de cola, tristes

de cabeza.

Poco a poco se fueron

componiendo,

haciéndose paisaje,

adquiriendo lunares, gracia, vuelo.

El gato,

sólo el gato

apareció completo

y orgulloso:

nació completamente terminado,

camina solo y sabe lo que quiere.



El hombre quiere ser pescado y pájaro,

la serpiente quisiera tener alas,

el perro es un león desorientado,

el ingeniero quiere ser poeta,

la mosca estudia para golondrina,

el poeta trata de imitar la mosca,

pero el gato

quiere ser sólo gato

y todo gato es gato

desde bigote a cola,

desde presentimiento a rata viva,

desde la noche hasta sus ojos de oro.



No hay unidad

como él,

no tienen

la luna ni la flor

tal contextura:

es una sola cosa

como el sol o el topacio,

y la elástica línea en su contorno

firme y sutil es como

la línea de la proa de una nave.

Sus ojos amarillos

dejaron una sola

ranura

para echar las monedas de la noche.



Oh pequeño

emperador sin orbe,

conquistador sin patria,

mínimo tigre de salón, nupcial

sultán del cielo

de las tejas eróticas,

el viento del amor

en la intemperie

reclamas

cuando pasas

y posas

cuatro pies delicados

en el suelo,

oliendo,

desconfiando

de todo lo terrestre,

porque todo

es inmundo

para el inmaculado pie del gato.



Oh fiera independiente

de la casa, arrogante

vestigio de la noche,

perezoso, gimnástico

y ajeno,

profundísimo gato,

policía secreta

de las habitaciones,

insignia

de un

desaparecido terciopelo,

seguramente no hay

enigma

en tu manera,

tal vez no eres misterio,

todo el mundo te sabe y perteneces

al habitante menos misterioso,

tal vez todos lo creen,

todos se creen dueños,

propietarios, tíos

de gatos, compañeros,

colegas,

discípulos o amigos

de su gato.



Yo no.

Yo no suscribo.

Yo no conozco al gato.

Todo lo sé, la vida y su archipiélago,

el mar y la ciudad incalculable,

la botánica,

el gineceo con sus extravíos,

el por y el menos de la matemática,

los embudos volcánicos del mundo,

la cáscara irreal del cocodrilo,

la bondad ignorada del bombero,

el atavismo azul del sacerdote,

pero no puedo descifrar un gato.

Mi razón resbaló en su indiferencia,

sus ojos tienen números de oro.



 


Pablo Neruda


 



Oda al gato


 

Autoria e outros dados (tags, etc)

02:57